quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Do universal ao Particular


Dando continuidade à proposta da SME de incentivar à leitura, a iniciativa do CEMAE foi a de sortear mensalmente um livro para algum funcionário que, após a leitura, o repassaria para outro colega, além de compartilhar alguma impressão acerca do mesmo. Segue aqui o primeiro deles.

Sobre o livro: As crianças aprendem o que vivenciam
Editora: Sextante / Gmt
 
É comum nos depararmos com “princípios e métodos universais”. Conselhos, ensinamentos, bate-papos, discussões, vez por outra evocam sentenças cujo saber pretende englobar em uma situação o que tende a ser o comportamento comum.

Utilizamos isto até sem perceber, afinal, tais ensinamentos fazem parte de um arcabouço do aprendizado com o qual nos constituímos. Dos mais antigos herdamos ditados e regras básicas que nos orientam até os dias de hoje. Ao dirigirmos aos da nossa geração, não fazemos cerimônia para falar em nome destes antigos algo como “minha avó dizia”, “meu pai ensinou”, etc.

A educação é pródiga em tentar criar o traço único. Fazer das pequenas mentes ávidas por conhecimento um só corpo recebedor do saber dos antepassados.

Curiosamente, entretanto, foi um grande pensador do tipo “universalista” que colocou esta ordem em xeque. Foi Kant, grande iluminista, que em uma das reflexões acerca da prática pedagógica que há duas atividades impossíveis de exercer. Governar e Educar. Impossíveis porque entre aquilo que se espera quando ensina e aquilo que se produz pelo aprendente, há um abismo sobre o qual não temos controle.

Por mais que o governante se posicione como aquele que atende aos interesses da população, há lacunas que jamais são preenchidas a não ser com críticas e insatisfações. O mesmo se dá na educação onde o professor, figura central, não tem garantias de que aquilo que ele ensinou em sala de aula foi aprendido da maneira como ele esperava ou sequer foi ouvido pelo aluno. O resto disto é a insatisfação de muitos, frustração dele mesmo e a sensação de impotência e falibilidade do sistema.

Ora, entre o grupo de que se pretende extrair o UM, há uma série de sujeitos ingovernáveis, ineducáveis. Sujeitos que escapam à norma, ao todo, ao completo.
Podemos agora facilmente pensar isto sobre a criança. Não esqueçamos o que aprendemos com nossos pais e não deixemos de ensinar o que supomos nos ter feito bem. Mas não vamos nos iludir. Não há receita. Não há determinismo na educação. Nem tudo aquilo que acreditamos como bom exemplo resultará em uma boa atitude por parte da criança. Nem tudo o que vemos como trágico e exemplo negativo, produzirá um cidadão de mau caráter, por assim dizer.

Como então educar esta criança que chegou até a mim sem nenhum manual de instruções? Apenas eduque, sem esquecer do que aprendeu, mas tampouco sem ignorar o que ainda pode ser aprendido. E quem lhe ensinará é a própria criança. Esta que, ao ser ouvida, lhe dirá algo que somente ela pode ensinar. Algo que foi construído em sua relação com ela e que manual algum poderá remediar, sequer apontar como erro ou acerto. Se, quando criança você aprendeu com os adultos, pode apostar, muito mais eles aprenderam com você. Se quer ensinar algo a uma criança, disponha-se a aprender com ela o que esta criança é.

Gustavo Martins